31/05/2025
"Você está fora da linguagem dos sentimentos e das emoções. Você é a Antilinguagem."
Com 10 anos de idade, Annie Ernaux assalta uma história que não lhe foi (conscientemente) dirigida. Sem preparo, sem gestação e sem parto, ela deixa de ser a filha única e se torna irmã. Descobre que a outra filha morreu anos antes dela nascer.
O livro gira em torno dos impactos desse segredo na família, não através do olhar dos pais enlutados, mas sim da filha que permaneceu. Falam dos perturbadores sentimentos e das fantasias que preenchem os silêncios deixados pela não narrativa do que foi, do que é.
"Os pais de uma criança morta não sabem o que a dor deles causa à criança que está viva."
A Outra filha, da escritora Annie Ernaux, é um livro pequeno, com poucas páginas, mas que logo de início revela seu peso e suas intensidades.
Ele nos alcança com frases claras, diretas, sem labirintos ou confusões, e ainda assim, não perde sua profundidade.
A autora consegue fazer do individual algo coletivo, fala da origem pobre, dos lutos silenciados, dos segredos familiares e de uma persistente tentativa de buscar um sentido para sua sobrevivência, para o acaso que a permitiu "ficar".
Uma história que, de tão escancaradamente individual, se torna coletiva.