31/03/2020
Há poucos dias atrás buscávamos por mais tempo. Dizíamos não conseguir fazer nada. Faltava tempo.
Então deixamos de lado muitas coisas, de olhar pra tantos pequenos detalhes do dia. A vida estava passando entre os dedos. E a gente nem percebia.
Estávamos todos olhando para a tela do celular e mesmo perto estávamos longe. Agora estamos longe e queremos estar perto. E estamos longe demais de alguns e perto demais de outros.
E o tempo? Ahhh, esse não volta mais!!!
Mas e agora? O que nos falta?
De maneira imperativa recebemos a ordem: Fique. Começamos a descobrir que não é uma questão de tempo, mas de ficar.
Ficar implica na oportunidade e desafio de estar com você, de entrar em contato com sentimentos e pensamentos que podem não ser tão prazerosos.
Fique, porque agora eu lhe tirei a correria que impedia de pensar. Fique com o casamento em crise e a relação que morre aos pouquinhos. Fique com a insatisfação com a forma que lida com as crianças. Fique com os seus medos. Fique com a ansiedade. Fique com a completa ausência de controle. Fique com a mãe que te ofende e você não tem coragem de colocar um limite na relação. Fique com o irmão que, em condições normais de temperatura e pressão, vocês mal se cruzam em casa. Fique com os seus vazios e os seus excessos. Fique com você. Sem aglomerações, sem restaurantes, sem shoppings, sem parquinhos, sem sair pra matar o tédio. Fique com o tédio também. Nós não aprendemos a ficar. A gente aprendeu a fugir do que dói. A fugir da dúvida, do medo, do problema. E a vida agora diz fique. Aqui. Agora. E ficar dói. Há, no entanto, um presente em ficar. Os incômodos pedem movimento. Os conflitos pedem resolução. O medo, depois de encarado frente a frente, se transforma. As conversas difíceis acontecem. E a gente aprende que o que dói ja dói faz tempo, só estava barulho demais pra ouvir. Fique. Aproveite e fique também no abraço demorado. No banho quente. Na gargalhada, mesmo que ao telefone. Fique com o cheiro de comida recém preparada. Fique com o vento que bate só naquela janela. Fique com o brilho da lua. A vida já falou sutilmente e a gente não ouviu. Fique.
Texto: Maria Teresa Coan
Psicóloga
(Inspirado no texto de E Santos)