25/04/2020
Quando nosso cérebro escolhe não sentir para não sofrer
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O sofrimento não é uma escolha pessoal; ninguém escolhe a dor ou o isolamento emocional por vontade própria. Infelizmente não existe nenhuma anestesia para não sofrer; as épocas escuras devem ser confrontadas com integridade, valentia e ilusões renovadas.
A vida nem sempre é fácil. Esta frase é-nos dita com muita frequência, e quem até o momento teve a sorte de não ser “tocado” pela adversidade não compreende ainda o realismo destas palavras.
Viver é confrontar provocações, construir um, dois, seis ou mais projectos, é permitir que a felicidade abrace as nossas vidas, e aceitar que, de vez em quando, o sofrimento baterá à nossa porta para nos colocar à prova.
E não, nem todos assumimos esses golpes que a vida nos traz da mesma maneira. Há quem confronte melhor as decepções e quem, por outro lado, as interiorize permitindo que minem a sua auto-estima.
Nenhuma tristeza é vivida de igual maneira, assim como nenhuma depressão tem a mesma origem, nem é sentida igualmente por todas as pessoas.
Mas existe um sintoma muito comum que, de algum modo, todos teremos que experimentar alguma vez: a anedonia.
A anedonia é a incapacidade de sentir prazer e aproveitar as coisas boas. O nosso cérebro, por assim dizer, “decide desconectar-se”. Não sentir para não sofrer, isolar-se, ficar anestesiado.
Pode ser que você já tenha sentido isso durante alguns dias, quando é consumido pela apatia, tristeza e pelo desânimo, mas o que acontece quando isso se torna crónico? O que acontece quando deixamos de “sentir a vida” por completo de forma crónica?
Hoje queremos tratar desse assunto para lhe oferecer informações que nos aprofundem no conhecimento deste aspecto tão importante.
A anedonia, quando perdemos o prazer de viver
Como indicamos no início, não existe nenhuma anestesia adequada para a dor da vida. Quando a anedonia aparece no nosso cérebro, como um mecanismo de defesa, ela não nos está causando nenhum bem. Pelo contrário.
Vamos começar esclarecendo alguns aspectos:
A anedonia não é uma doença, nem um transtorno: é um sintoma de algum processo emocional ou de algum tipo de doença.
Embora seja certo que, na grande maioria dos casos, ela está relacionada de forma íntima com a depressão, ela também se pode manifestar como resultado de uma esquizofrenia ou de demências como o Alzheimer.
Todos, em maior ou menor medida, experimentamos anedonia alguma vez na vida: falta de interesse pelas relações sociais, pela comida, pela comunicação com os outros…
O verdadeiro problema chega quando a anedonia levanta um muro a nossa volta e nos tira todas as nossas características de humanidade: não sentimos nada diante das expressões de carinho, não precisamos de ninguém do nosso lado e nenhum estímulo nos produz prazer, nem a comida, nem a música… nem nada.
Se escolhemos deixar de sentir para não sofrer, não nos estaremos protegendo de nada. Estaremos fechando as portas à vida, seremos almas que vão definhando aos poucos…
A anedonia a nível cerebral
Esta baixa receptividade frente aos estímulos exteriores tem claro reflexo num cérebro deprimido.
É importante levarmos em conta que tipo de processos se desencadeia no nosso interior quando experimentamos a anedonia:
Se esse estado se tornar crónico e se prolongar no tempo, as nossas estruturas cerebrais sofrem mudanças, e isso afecta os nossos julgamentos, pensamentos, emoções e sentimentos.
O lóbulo frontal, relacionado com a tomada de decisões, reduz-se.
Os gânglios basais, relacionados com o movimento, ficam afectados até o ponto em que até nos levantarmos da cama exige um grande esforço.
O hipocampo, relacionado com as emoções e a memória, também perde volume. É comum que tenhamos falhas de lembranças, que soframos sem defesa, que fiquemos obcecados por pensamentos negativos.
Frequentemente, a depressão é conhecida como a doença da tristeza. Mas na realidade, ela é uma coisa que vai mais além, ela é a prisão de um cérebro emocional que não encontra respostas para os vazios da vida, a decepção, a perda da ilusão.