13/03/2021
Li há pouco tempo, um texto onde os autores falavam sobre como fomos ensinados a entender o processo da vida como uma sucessão de fases, uma termina, conclui-se, aprendemos tudo o que cabe nela para assim iniciarmos outra, até o alcance maior da maturidade. Por pensarmos assim, tudo que é tido como uma “regressão”, ou seja, ter uma atitude dita infantil ou inconsequente, é normalmente vista como algo negativo. Como se a cada aprendizado fossemos lançando mão de alguém que fomos, dos erros que cometemos, para nunca mais repeti-los. Como casacos que soltamos do corpo e jogamos ao longo do caminho e por isso jamais voltam a nos pertencer. Fui machista, não sou mais. Fui egoísta, não sou mais. Fui boba, mas aprendi. Não quero dizer aqui que não aprendemos, não evoluímos, não escolhemos ser melhores do que fomos, mas que o que fomos segue sendo parte de nós. Os autores pensam então que a vida não se faz em fases, ela é um círculo que vai aumentando de tamanho, se abrindo a cada nova experiência recolhida, “todo o já sido não f**a para trás ou para fora do círculo”. Quando aprendemos uma segunda língua não deixamos de ser nativos da primeira, ainda que agora se possa escolher em qual permanecer. É quase impossível não revisitar a outra. Por isso voltamos hora ou outra aos erros cometidos. Por isso é tão difícil manter um status contínuo da Fada Sensata. Porque sustentar a maturidade sem regredir é impossível, a sensatez acaba, as certezas se dissipam e voltamos ao não saber, a estupidez. Viver é contraditório e circular e não coerente e retilíneo.
Reflexão feita a partir das leituras: Na presença do sentido. Uma aproximação fenomenológica a questões existenciais básicas (Pompéia e Sapienza, 2013) e Filosofia Mestiça (Michel Serres, 1993).