23/11/2025
Eu estava sentado no meio-fio, pronto para desistir de tudo. Até que senti um focinho frio na minha mão.
Era uma terça-feira.
Dia comum. Céu cinza. Vida cinzenta.
Eu tinha acabado de sair do banco. Conta no vermelho. Empréstimo negado. Aluguel atrasado.
Me sentei no meio-fio daquela rua movimentada.
Cabeça baixa. Mãos tremendo. Pensamentos gritando.
"Não tem saída."
"Você não vale nada."
"Seria melhor se..."
Eu estava ali. Perdido. Quebrado. Invisível.
Até que senti algo.
Algo úmido. Frio. Suave.
Um focinho.
Tocando minha mão.
Levantei os olhos.
E lá estava ele.
Um vira-lata. Caramelo. Magro. Sujo. Com cicatrizes pelo corpo.
Ele não latiu.
Não abanou o rabo.
Não pediu comida.
Só ficou ali.
Olhando pra mim.
Como se dissesse:
"Eu sei. Eu também já estive aí. Mas tô contigo."
Eu não sei explicar.
Mas naquele momento, algo dentro de mim quebrou.
Chorei.
Ali mesmo. No meio-fio. No meio da rua.
Com aquele cachorro sentado do meu lado.
E ele não saiu.
Ficou comigo. Em silêncio. Como se entendesse tudo sem precisar de palavras.
Quando me levantei pra ir embora, ele me seguiu.
Eu tentei espantar. "Vai, vai embora. Eu não tenho nada pra te dar."
Mas ele continuou.
20 metros atrás. Sempre.
Parei. Ele parou.
Virei a esquina. Ele virou.
Peguei o ônibus. Ele ficou esperando no ponto.
Pensei: "Pronto. Ele vai embora."
No dia seguinte, saí de casa pra tentar arrumar um bico.
E lá estava ele.
Sentado no meu portão.
Como se tivesse passado a noite ali. Esperando.
Eu não tinha comida. Mas comprei um pacote de ração com os últimos R$ 8 que me sobravam.
Coloquei no chão. Ele comeu devagar. Olhando pra mim entre cada mordida.
Como se agradecesse. Como se dissesse: "Obrigado por não me ignorar."
E eu pensei: "Pelo menos alguém precisa de mim."
No terceiro dia, deixei um pano velho no portão.
Pra ele dormir.
No quarto dia, coloquei uma vasilha com água.
No quinto dia, abri o portão.
"Entra. Mas só por hoje, viu?"
Ele entrou. Deitou num canto. E dormiu.
Como se finalmente tivesse encontrado casa.
Hoje, 2 anos depois, esse danado é dono da casa.
Ele me espera voltar da feira. Todo dia. No mesmo horário.
Rosna pro vizinho que joga lixo na calçada.
Late pros moleques que fazem barulho de madrugada.
E me obriga a levantar todo dia às 6h da manhã.
Porque ele quer ver o sol nascer. E não vai sozinho.
Tem gente que acha que eu adotei ele.
Mas a verdade é outra:
Foi ele quem me adotou.
Porque naquele dia no meio-fio, eu estava desistindo.
Eu tinha perdido tudo. O emprego. A dignidade. A esperança.
Eu estava sozinho. E não via saída.
Mas aquele cachorro — que também estava sozinho, também estava perdido, também estava machucado —
Ele me encontrou.
E decidiu: "Esse cara precisa de mim. E eu preciso dele."
Hoje eu trabalho.
Não é grande coisa. Entrego comida de bicicleta. Faço bicos.
Mas eu acordo todo dia. E tenho motivo.
Porque tem alguém esperando por mim.
Alguém que não me julga.
Que não me cobra.
Que não liga se eu tenho pouco.
Alguém que só quer que eu exista.
Às vezes eu olho pra ele dormindo no sofá (sim, ele conquistou o sofá).
E penso: "O que seria de mim se você não tivesse aparecido naquele dia?"
E a resposta é assustadora.
Porque eu estava no limite.
No fio da navalha.
A um passo de fazer algo irreversível.
Mas aquele focinho frio na minha mão mudou tudo.
Me lembrou que eu não estava completamente sozinho.
Que ainda havia algo no mundo que precisava de mim.
E isso foi suficiente.
Suficiente pra eu levantar.
Suficiente pra eu tentar mais um dia.
E depois outro.
E outro.
Até virar 2 anos.
Hoje, quando alguém me pergunta: "Por que você adotou ele?"
Eu respondo:
"Eu não adotei. Ele me salvou."
Porque esse cachorro, que todo mundo ignorava na rua, que ninguém quis, que ninguém olhava...
Ele viu em mim algo que eu não via mais:
Valor.
Ele não ligou que eu estava quebrado.
Não ligou que eu não tinha dinheiro.
Não ligou que eu era um fracasso.
Ele só decidiu que eu merecia companhia.
E com isso, me deu motivo pra continuar.
Então, se você está lendo isso e se sentindo sozinho.
Se está no fundo do poço.
Se está achando que não tem mais saída.
Eu quero te dizer uma coisa:
Às vezes a salvação vem no formato que a gente menos espera.
Às vezes é um cachorro de rua.
Às vezes é um estranho que sorri.
Às vezes é uma música. Uma ligação. Um amanhecer.
Mas ela vem.
Se você der mais um dia.
Só mais um.
E quem sabe, no meio do caminho, você também encontre um focinho frio tocando sua mão.
Te lembrando:
"Tô contigo. A gente se salva junto."
🐾💛
Esse é Rex. Ele me encontrou quando eu estava perdido. E hoje, a gente se levanta todo dia pra ver o sol juntos.
Porque ninguém se salva sozinho. Às vezes, você só precisa de alguém que decida ficar. Mesmo quando tudo diz pra ir embora.