29/08/2020
O ator Chadwick Boseman, nosso eterno Pantera Negra, morreu dia 28/08 vítima de um câncer do qual lutava há quatro anos. Sinto dificuldades em expressar a grandiosidade desse homem, o legado que ele deixou e as marcas que ficarão para sempre em meu coração. Sua trajetória de sucesso justamente ocorreu nos ultimos quatros anos, entre cirurgias, quimioterapias, dores e medos. Ele brilhou, viveu e se realizou. Estrelou um dos melhores filmes que já assisti. Fez história ao ser o primeiro filme da Marvel indicado ao Oscar de melhor filme. Todos os protagonistas são negros, trazendo uma representatividade importante na luta antirracista além de não deixar de lado referências políticas e culturais africanas, nunca antes vistas em filmes, principalmente desse estilo. Para dar vida ao nosso querido T'Challa precisou de uma rotina intensa de exercícios. Treinou jiu-jitsu, capoeira e outras artes marciais. Quebrou recordes de bilheteria, foi um verdadeiro sucesso! Ah, Chadwick Boseman também se casou com o amor da sua vida o ano passado. Ufa!
E tudo isso em meio à morte!
Por acaso me lembrei de alguns trechos tão pertinentes do livro "A morte é um dia que vale a pena viver" da médica Ana Claudia Quintana Arantes, especialista em cuidados paliativos e que cuida de pacientes em processo de morte. Em uma parte do livro ela diz que devemos ter respeito pela morte já que nem o medo e nem a coragem salvam ninguem do fim mas o respeito pode trazer força, equilíbrio e harmonia nas nossas escolhas enquanto ainda temos ar em nossos pulmões. "A morte se dá em um dia mas quando nos abandonamos morremos antes da morte", ela diz. Morremos mais depressa. O medo, o tabu e as fragilidades nos fazem morrer muito antes do tempo que nos foi determinado. O rei de Wakanda devia ter morrido há quatro anos quando recebeu um duro diagnóstico? Quanto mais ele poderia realizar? Entre o nascimento e a morte só o que temos é vida, e vida é TEMPO. É dentro dele que precisamos conferir algum significado à nossa existência. A autora nos pergunta em seu livro: "O que fazemos com esse tempo que vai passando?". É uma pergunta clichê porém muito necessária. O dia tem 24 hs para todos mas é relativo quando nos permitimos viver plenamente ou não. E viver plenamente não é viver sem dor, privação ou sofrimento. Viver é viver. Estar presente. Muitos existem mas não vivem, estão ausentes da própria vida. Como ela define, são zumbis existenciais. Falta conexão com o outro, com a natureza, com o mundo, com o sagrado e mais ainda, falta conexão com o próprio mundo interno.
Quando li sobre a história de Boseman constatei que sempre há tempo para se conectar, buscar sentido, viver, realizar, sentir, perdoar, amar. Até mesmo diante de um diagnóstico duro ou ainda na hora da morte, sempre haverá tempo para uma epifania, para um despertar. Quanto mais cedo essa busca ocorrer, mais tempo talvez teremos para desfrutar de uma vida digna. Chadwick Boseman sabia disso. Escreveu recentemente ao seu melhor amigo e também ator Josh Gad: "Inspire e expire este momento e agradeça a Deus pelas belezas únicas e maravilhas deste dia. Nós devemos aproveitar cada momento que podemos para desfrutar a simplicidade das criações de Deus, seja se está céu claro e sol ou nebuloso com escuridão". Claro que Gad se refere ao amigo que partiu como " alguém que sabia quão preciso era cada momento".
Para finalizar, Ana Claudia diz que "é preciso ter respeito pela grandeza do ser humano que enfrenta sua morte. O verdadeiro herói não é aquele que foge desse encontro mas sim aquele que o reconhece como sua maior sabedoria".
Mais que um herói dos cinemas, Chadwick Boseman foi um verdadeiro herói na vida real.