18/05/2021
Dor de cabeça e dor na cabeça.
Por Dr. Hilton Mariano da Silva Júnior
Ter um episódio de cefaleia (dor na cabeça) é uma situação extramente comum. É uma das queixas mais frequentes do mundo. E, por vezes, atrapalha a vida de muita gente. Talvez, por isso, para descrevermos o quanto uma situação nos impactou negativamente (tal como perceber que o pneu do carro está furado num dia de chuva, ter uma discussão com um familiar ou colega de trabalho, sofrer uma decepção ou qualquer tipo aborrecimento) falamos que foi uma tremenda dor de cabeça. Do mesmo modo que isso descreve o quanto ficamos chateados com aquela situação, pode levar a crer que a causa da maioria das dores na cabeça seja de fundo emocional. O dicionário Houaiss traz duas definições para dor de cabeça: “1. cefaleia 2. preocupação incessante com alguém ou alguma coisa". A meu ver, a dor de cabeça sofre com a mesma interpretação de dor de cotovelo, definida no mesmo dicionário como “despeito provocado pelo ciúme ou pelo fato de se ter sofrido alguma decepção amorosa". Ora, é muito comum ter dor quando batemos o cotovelo em alguma coisa( inclusive frequentemente se sente um choque provocado pelo nervo ulnar) e não dizemos que o estamos com dor de cotovelo e sim, dor no cotovelo. Tal confusão produz a dificuldade da pessoa que está do lado em compreender o sofrimento daquele que tem crises de cefaleia. A maioria dos nossos/nossas pacientes reclama da incompreensão dos familiares e amigos em relação ao impacto que dor na cabeça provoca. Esse comportamento se expressa por menosprezo, ou até desdém, com o qual o doente é tratado pelas pessoas próximas ou profissionais de saúde.
Não se pode negar que situações de estresse ou emoções negativas podem desencadear as crises de cefaleia. Porém, várias outras doenças também são influenciadas por essas emoções (tais como asma, hipertensão arterial, diabetes, entre outras) e habitualmente não provocam reações de desconfiança e menosprezo com a pessoa que sofre. A hipertensão é um bom exemplo: mesmo que um aumento súbito da pressão seja provocado por um grande aborrecimento, tratamos o paciente com medicações para controlá-la. Não tentamos convencê-lo simplesmente de que a causa é emocional. Estranhamente, a maioria dos meus pacientes com dores na cabeça relata que ouviu a frase “a causa da sua dor é só emocional", como se ouvir isso tivesse o poder mágico de acabar com o problema.
Considerando que a maneira de se comunicar é extremamente importante para a mensagem que se quer passar, sugiro que dor de cabeça (assim como dor de cotovelo) seja um termo reservado para falarmos de aborrecimentos e que dor na cabeça seja usado quando sentirmos cefaleia.