13/10/2025
Vivemos em um mundo onde tempo e espaço já não são limites como antes. Com um clique, falamos com alguém do outro lado do planeta. Não é mais preciso viajar, esperar ou sequer estar fisicamente presente. Essa separação entre tempo e espaço, que o sociólogo Anthony Giddens chama "desencaixe", transforma profundamente nossa forma de viver e de nos relacionar.
No passado, a experiência era construída no contato direto, no corpo presente, no tempo vivido. Hoje, a mediação tecnológica substitui a presença por conexões digitais. Isso gera uma sensação de aceleração constante e, ao mesmo tempo, de vazio. Estamos sempre conectados, mas muitas vezes desconectados de nós mesmos. A ausência de limites concretos alimenta uma ansiedade difusa: tudo é possível, mas nada é estável.
A forma como lidamos com a propriedade também mostra o efeito do desencaixe. Se antes possuir terras era sinal de poder, hoje, títulos financeiros e ativos digitais, coisas que não se tocam, definem quem tem ou não tem. A realidade concreta dá lugar a abstrações. Isso pode gerar insegurança, afinal, se tudo é abstração, o que é realmente concreto?
Até nossos corpos entram nesse jogo. Com a multiplicação de procedimentos estéticos, filtros e cirurgias, a idade se torna um enigma. O rosto não revela mais o tempo vivido. Isso pode parecer libertador, mas também nos afasta da aceitação do envelhecimento e da finitude. O corpo, que antes contava nossa história, agora tenta apagá-la.
Essas transformações têm um custo psíquico. A constante necessidade de se adaptar, de se reinventar, de parecer jovem e produtivo, alimenta ansiedades, inseguranças e uma sensação de insuficiência. A experiência, esse saber que vem do tempo vivido, é trocada por simulações, por atalhos, por inteligências artificiais que pensam por nós.
Estamos, aos poucos, renunciando à experiência em nome de uma fantasia de eficiência. Será que estamos preparados para viver num mundo onde tudo é imediato, marcado pelo desencaixe e pela compressão de tempo e espaço, e ainda assim acolher a subjetividade humana? Reapropriar-se da experiência singular é, hoje, um ato revolucionário.
Foto de David Young