02/02/2016
ZIKA VÍRUS E SEUS DESAFIOS PARA O BRASIL:
Nos últimos meses, o Brasil tem visto a disseminação do vírus zika (e de suas consequências) pelo território nacional. Conhecido pela Medicina desde 1947, o vírus foi responsável por casos isolados de doença febril aguda por vários anos em países da África e da Ásia até chegar à Oceania. Nos anos de 2013 e 2014, um surto com mais de 28 mil casos ocorreu na Polinésia Francesa.
No Brasil, a disseminação do vírus com rapidez é explicada pela grande presença, em nosso território, do mosquito Aedes aegypti, cada vez mais resistente aos métodos de controle, e já implicado na transmissão da dengue e da febre chikungunya. Os primeiros casos de zika no Brasil foram diagnosticados na Bahia, em abril de 2015. Quase 7 mil pessoas foram notif**adas com uma doença exantemática sem causa definida e com curso autolimitado. Exames complementares foram capazes de diagnosticar a infecção pelo vírus zika.
A zika é uma doença febril de curta duração, habitualmente com febre baixa, caracteristicamente com aparecimento precoce de exantema, sendo o mesmo bastante proeminente e pruriginoso. Conjuntivite e edema articular são achados frequentes. Portanto, apresenta características clínicas distintas da dengue clássica e, ao contrário desta, não está implicada com complicações hemorrágicas e discrasias sanguíneas. O tratamento é sintomático e a recuperação espontânea é a regra.
A primeira complicação da infecção pelo vírus zika observada no Brasil foi a síndrome de Guillain-Barré. Sabe-se que essa polirradiculoneuropatia desmielinizante, caracterizada por fraqueza muscular ascendente, pode se seguir a uma série de gatilhos infecciosos e não-infecciosos. No Nordeste brasileiro, logo após o início dos casos de zika, observou-se elevação signif**ativa do número de casos da doença em relação às médias históricas. O mesmo comportamento foi documentado em nações da Oceania com zika.
Mas a complicação mais temida da zika seria documentada a seguir: a formação de fetos com microcefalia e alterações cerebrais em mães com infecção pelo vírus durante a gestação. Pediatras e Obstetras no Nordeste passaram a observar um grande aumento de casos de microcefalia ao nascimento e intra-útero. Muitas das mães e gestantes tinham história clínica de doença exantemática aguda durante a gestação e o material genético do vírus zika foi encontrado no líquido amniótico e em tecidos de fetos e natimorto.
A microcefalia, que tem uma infinidade de causas, é definida como o perímetro cefálico igual ou menor a 32 centímetros para recém-nascidos com 37 semanas ou mais de gestação ou abaixo do percentil 3 para recém-nascidos antes de 37 semanas. Crianças com infecção por zika apresentam, via-de-regra, microcalcif**ações periventriculares e corticais, hipoplasia de vérnix cerebelar e, em alguns casos, lisencefalia. Crianças com suspeita de infecção devem ser submetidas a exames de imagem e avaliação auditiva e oftalmológica, ao nascimento. Todas as crianças com malformação confirmada deverão ser inseridas num Programa de Estimulação Precoce, desde o nascimento até os 3 primeiros anos de vida.
No momento, há muitas dificuldades diagnósticas de zika em adultos, gestantes, fetos e recém-nascidos. Não existe sorologia comercialmente disponível e o diagnóstico só é possível através de exame de biologia molecular (PCR), procurando pelo material genético do vírus zika (RNA) no sangue, líquidos corporais e tecidos humanos, havendo limitações de acesso a esse tipo de exame no Brasil. Amostras devem ser coletadas em gestantes, parturientes e recém-nascidos e encaminhadas para centros de referência.
Como a descrição de microcefalia como complicação de zika em gestantes é um evento novo na Medicina, ainda existem muitas dúvidas que somente serão esclarecidas quando houver um maior conhecimento sobre a história natural da doença. Em princípio, o maior risco de microcefalia decorre da infecção materna por zika no 1º trimestre de gestação, mas os riscos nos demais períodos de gestação ainda não estão elucidados. É desconhecida, também, qual a porcentagem de fetos que desenvolve microcefalia após infecção gestacional por zika.
Nesse cenário, gestantes se protegem com repelentes, cada vez mais escassos (e, eventualmente, com eficácia contra o mosquito questionada) e evitam viagens para áreas de maior circulação de zika. Quanto às iniciativas de combate ao vetor, o controle biológico continua em fase de estudo e os métodos tradicionais parecem pouco ef**azes. Não há perspectiva em curto e médio prazo de vacina. Sobre engravidar agora ou não, não há consenso sobre a conveniência, devendo-se avaliar individualmente. Neste início de 2016, o número de casos suspeitos de microcefalia por zika já passou de 3 mil.