23/12/2020
Entrevista:
Especial Natal
NATAL E ANO NOVO EM TEMPOS DE PANDEMIA
Como manter o espírito natalino e vivenciar melhor a realidade de estar entre a vida e a morte e na expectativa da cura através de uma vacina
Adriana do Amaral
Correspondente
São Paulo - Clara Eugenia San Martin é psicóloga, psicopegagoga e especialista em terapia cognitiva. Uma colecionadora de títulos, curiosa na ciência a serviço da pessoa humana que é. Principalmente, profissional atenta ao outro e que, através da escuta e leitura do mundo, nos faz ver além do hoje e os problemas vividos agora.
Preservando uma visão positiva neste momento em que o mundo globalizado enfrenta a grave da ameaça do , ela conversou com o QUARENTENA NEWS sobre celebrações em tempo de social.
QUARENTENA NEWS: Estamos às vésperas do Natal e a poucos dias do Ano Novo. Tempos de alegria para uns e tristeza para outros, porém nunca, na sociedade moderna, a humanidade viveu momentos tão intensos dessa dualidade. Como vivenciar as festas nesse clima de incerteza? Temos o que celebrar? O inconsciente coletivo ajuda ou atrapalha?
CLARA: O ser humano sempre tem o que celebrar. Quem está aqui é aquele que está vivo, que tem esperança, ainda se cuida e mantém a coisa mais bonita que é a fé e a convicção íntima de que vamos encontrar uma cura, que a vacina está chegando e as pessoas estão melhorando.
É importante lembrar que o inconsciente coletivo vibra positivamente com a mesma força e a forma que vibra negativamente. Não podemos esquecer que a esperança saiu, na mitologia grega, da Caixa de Pandora, quando todos os males do mundo apareceram na história. Mas, a esperança do ser humano sempre foi maior, pois ela tem mão dupla. E a esperança pode continuar, pois sempre quem está aqui é quem está vivo.
Se a gente levar em conta o que é o mundo, hoje, a desilusão coletiva está no pulsar do mundo: na fome e em todos os problemas que estamos enfrentando com a saúde. No Brasil, especialmente nessa tentativa de desmanche dos SUS (Sistema Único de Saúde) e na forma com que as pessoas estão sendo levadas a serem cuidadas ou se curar quanto à pandemia.
Não podemos esquecer de que o negacionismo também é um fato importante. A falta de consciência e de empatia para com quem perdeu os seus entes queridos, mas também o fato de as pessoas não se cuidarem e aglomeraram, expondo os demais. Esse bando de gente inconsciente. O mal do mundo.
Mas, eu acredito que, do ponto de vista psicológico, aqueles que têm consciência estão dentro da esperança. Já quem não tem consciência não muda nada.
QUARENTENA NEWS: Parece que nessa época a saudade aumenta, não é mesmo? É possível celebrar o hoje e enfrentar a sensação de isolamento e a ausência daqueles que amamos? Estar presente mesmo ausente? Seriam tempos de valorizar quem está perto e a nossa própria vida?
Clara: Sim, a saudade aumenta, mas também porque as pessoas têm o habito de se encontrarem no final do ano. Inconscientemente e coletivamente, é um tempo de reflexão. Do que fizemos e da programação do que vamos fazer.
Vivemos hoje um momento importante dentro das redes, desde o advento da Internet. Há cem anos, durante a incidência da gripe espanhola, não tínhamos esse meio de comunicação que agora temos. O que permite que as pessoas tenham informação. Elas têm até se falado muito mais, se unido mais.
O estar presente está mais forte, e a valorização da vida ainda mais forte do que antes da covid-19. E isso está sendo muito importante! Mas, volto a repetir, naquele grupo dos negacionistas não muda nada.
QUARENTENA NEWS: Praticamente todas as famílias perderam um ente querido ou um conhecido nos últimos meses. A segunda onda da -19 chegou e a esperança da vacina nos motiva a resistir. Mas são tantas as crises sobrepostas: existenciais, econômica, política. É possível fazer planos nesse cenário caótico? Você nos daria um conselho para resistir àqueles momentos onde a tristeza e a ansiedade parece tomar conta de nós?
CLARA: É claro que quem perdeu alguém vai ter um final de ano muito difícil, pela dor do luto. Provavelmente com algumas expectativas muito diminuídas.
Quanto ao panorama mundial atual, acredito que é do caos que nasce a ordem. Quem teve grandes perdas ou adoeceu de forma grave se uniu muito mais.
Particularmente, do ponto de vista psicológico, eu tive um ano de muito trabalho, tantas as demandas. No incômodo da depressão, da tristeza, da perda e do luto, as pessoas procuraram muito a psicoterapia e o aconselhamento. Eu precisei montar grupos e muito foi realizado virtualmente. Chegamos num momento, dentro da psicoterapia, que nós, psicólogos, praticamente não percebemos mais o que é online e o que não é. Uma nova forma de encontro que tem se tornado extremamente natural.
É importante que além de ter fé na vida, façamos planos. Quem planeja é porque sonha, pois a tristeza toma conta na medida em que a gente não enxerga o futuro. Quando fazemos planos e enxergamos o futuro, a ansiedade diminui, porque temos aonde chegar.
O conselho é:
Faça planos, sonhe, tenha aonde chegar.