09/11/2021
Quando eu era criança, quase não via meu pai. Quando eu acordava, ele já havia saído e, quando eu ia dormir, ele ainda não havia chegado. Papai trabalhava durante o dia e estudava a noite. Uma vez ele me levou consigo para o trabalho. Foi bem divertido, porém cansativo. Quando chegou à tardinha eu já queria ir pra casa, mas ainda tínhamos que ir à universidade.
Na universidade, os corredores eram longos, pareciam não ter fim. Ao passo que meu pai andava apressado, eu segurava sua mão enquanto esbarrava em gente rica, bem vestida e cheirosa. Era claro pra mim a realidade de que meu pai era o único negro da turma. Na época, eu mesmo já havia experimentado ofensas pela cor da minha pele.
Ao fim da aula, tivemos que correr atrás de um professor. Àquela altura, eu já me arrastava. Meu pai quis me carregar, eu recusei. Eu queria andar, como ele, com ele. Finalmente encontramos o professor. Ele abriu uma pasta marrom e tirou de dentro dela um papel rabiscado de caneta vermelha, era uma prova.
Olhando meu pai por cima dos óculos, o professor disse:
“Ahh sim! Aqui está, Ribamar...confesso que fiquei decepcionado. Isso é coisa de gente burra, heim?”
Meu pai não esboçou resposta. Pegou a prova, dobrou ao meio e a enfiou na bolsa. Quanto a mim, eu apertava a mão do meu pai. Ia apertando e apertando sem dizer coisa alguma. Eu conhecia meu pai, ele não era b***o. Eu estava irado e, profundamente ofendido.
Por que nos ofendemos?
Cheguei à conclusão de que eu me ofendo porque sou alguém. Eu já era alguém, antes mesmo de nascer, antes mesmo de saber que eu já era alguém.
A dignidade do meu ser não é um construto oriundo de declarações humanas, porque, na realidade é a minha própria dignidade quem, antes de tudo, reinvidica todas essas coisas.
Um bebê é, por natureza, pura exigência de dignidade, por isso, não há ofensa mais desumana do que aquela infligida a um recém-nascido. Quanto mais puro é um ser, maior lhe é a ofensa dirigida. Aplique isso a Deus e você entenderá porque há inferno.
Eu sou alguém porque fui criado por Alguém. Logo, nós nos ofendemos porque há um Deus que se ofende.
Todos ofenderam a Deus.