30/05/2025
Um dos pontos que mais chama minha atenção no uso da Internet é a alteração da nossa relação com o tempo. Há mais de trinta anos, eu acompanhava com curiosidade as cartas que minha mãe recebia de uma prima que morava distante e de uma amiga que mudou-se para uma cidade vizinha. Também recordo-me com nostalgia de aguardar meu pai em ligações na cabine de um posto telefônico.
Já na minha adolescência, lembro quando criei meu primeiro e-mail, a descoberta das salas de bate-papo e as primeiras páginas navegadas.
Em poucos anos, os meios de comunicação e as formas de nos comunicarmos foram radicalmente alterados. A espera pela resposta do outro que poderia vir de uma carta ou de uma ligação com hora marcada, até mesmo a resposta de um e-mail, foi suplantada quando passamos a carregar em nossas mãos, quase como uma extensão dela, os smartphones.
Como poderia alguém visualizar e não responder? Como poderia demorar alguns minutos para responder se o telefone estaria supostamente colado ao corpo?
Junto a isso vieram as redes sociais com um feed sem fim, com memes e trends sempre renovados que nos encharcam de estímulos.
Longe da nostalgia dos tempos antigos, e das dificuldades que aquela época impunha, trata-se de pensar como passamos a lidar com a espera, com o tempo. O tempo do relógio, mas também o tempo da subjetividade. O tempo necessário para crescer, aprender, produzir questões, elaborar lutos. O tempo para contemplar, descansar. Recordar. Pensar.
Se a nossa relação com o tempo se estilhaça, perdemos junto um tanto da nossa possibilidade de construir memória. Nossa constituição psíquica depende do tempo. Mas não qualquer tempo. É o tempo do intervalo, da alternância, que possibilita as inscrições psíquicas. Sem inscrição, não há memória. E sem memória, que possibilidade temos de refletir sobre o que acontece conosco e com o mundo?