04/06/2018
À respeito de Processamento Auditivo Central
Este ano estou comemorando 40 anos de atividade em Terapia de Linguagem. Até 1985 trabalhava em duas clínicas: em uma como Audiologista e na outra como Terapeuta.
Durante a faculdade aprendemos sobre Audibilização, que era o nome, nos idos de 1973-1977, dado ao atual Processamento Auditivo, claro que também com menor suporte científico, o treinamento auditivo da época.
Com a vinda do Construtivismo e sua deficiente interpretação, os treinamentos, tanto os auditivos quanto os perceptivo-motores, infelizmente foram deixados de lado.
Não tenho referências, mas acredito que quem frequentou faculdade naquela época, principalmente profissionais como eu, que atuaram como audiologistas, nunca deixaram o treinamento de lado.
Então surgiu o Processamento Auditivo Central. E, como tudo aqui no Brasil, surgiu como se fosse a explicação de todos os problemas do mundo, e olha que não estou falando só de problemas de comunicação. Outro dia recebi um relatório de uma Terapeuta Ocupacional que dizia que o problema de motricidade fina da criança era devido à falhas de Processamento Auditivo Central(PAC).Me lembrei agora de uma fonoaudióloga que mandou um relatório para o neuropediatra Pedro Lupércio . Ela tinha encaminhado o cliente para que ele fizesse diagnóstico, mas no relatório , ela já havia decidido que tudo que a criança apresentava era por conta do PAC..
A diferença entre Audibilização e Processamento Auditivo Central é dada pelos avanços científicos e por considerar todo o processo da percepção auditiva , não só a discriminação auditiva. Hoje sabemos que todas as características dos sons são preciosas , tanto os verbais quanto os não verbais. Sabemos que temos que considerar todo o caminho, desde atenção até interpretação dos sons em todos seus aspectos.
Vejo pedagogas, psicopedagogas , professoras, neurologistas, e outros pedindo o referido exame indiscriminadamente . Um profissional que não seja da área , quando pega um resultado deste exame, é como nós leigos, quando recebemos RX, Ressonâncias e outros. Lemos o laudo. Quando a pessoa é encaminhada para um fonoaudiólogo, ele tem a chance de “dar nome aos bois”, e explicar o que cada resultado significa. Mas nem sempre isso acontece. Tem faltado muito se acreditar no ditado “Cada macaco no seu galho”.
Por outro lado, não são todas as fonoaudiólogas que fazem a avaliação de Processamento Auditivo, que estão muito aptas a realiza-los. Ou os planos de saúde não as deixam mostrar bem seus valores. Tenho recebido muito resultado cujo laudo parece um carimbo, um print. Além dos comentários e encaminhamentos que fazem sem nem mesmo ter feito uma rápida anamnese para saber o porquê do pedido. Recebi uma criança, que ao realizar o exame, foi orientado que fazendo 6 a 8 meses de treinamento , ficaria bem. Os pais já chegam com a previsão desse tempo de trabalho. Mas ela só esqueceu de perguntar aos pais , porque foram encaminhados ao exame: menino de 8 anos, na terceira série, sem estar alfabetizado, sendo que graças a professora deste ano, chegou ao final do semestre dominando silabação simples. Ou seja, ela encaminha os pais como se só o treinamento auditivo fosse “tapar os buracos” deixados pela dificuldade de reter alfabetização, no total da aprendizagem da criança. Posso citar outro: encaminhado pela otorrino para avaliação,para que ele pudesse fazer pelo convênio, o menino foi avaliado e depois encaminhado para avaliação neuropsicológica e fonoaudiológica. Isso quer dizer que a fonoaudióloga que fez a avaliação só se ateve ao encaminhamento da otorrino, pois o referido garoto já havia feito exame neuropsicológico e já está me terapia fonoaudiológica.
Resolvi escrever porque o Processamento Auditivo, sua avaliação e treinamento bem realizados, É DE EXTREMA IMPORTÂNCIA para o sucesso da terapia fonoaudiólogica nos pacientes com alterações em tal processo. Dizer que o treinamento auditivo é de competência da fonoaudiologia .
Eu, pessoalmente, não acredito que só o treinamento ajude, porque trabalho com distúrbios de aprendizagem. Então na minha terapia ,realizo o Processamento Auditivo e sua transposição direta para a linguagem oral, leitura e escrita. Também não acredito que só o treinamento auditivo em cabines acústicas sejam aconselháveis. Nosso mundo é completamente poluído sonoramente ,e duvido que alguma escola tenha uma sala de aula com tratamento acústico necessário .
Bom, procurei de uma forma simples falar que ando preocupada com estas avaliações, encaminhamentos e interpretações dos exames. Assim como me preocupa, a necessidade de estabelecer prazos para o trabalho, visto que esse tempo é muito individual e depende demais do problema e da criança que o apresenta.
Ana Ruth Mari