08/05/2018
Por meio dos meus livros, tenho "gritado" em muitos países que estamos violando a caixa-preta da construção de pensamentos dos nossos filhos, o que é gravíssimo. Estamos dormindo e, ao mesmo tempo, sonhando deslumbrados com o mundo digital que criamos.
Nunca foi tão difícil educar uma geração. Não há um culpado, o sistema é culpado. Todos temos nossa responsabilidade no assassinato da infância. O que me dói na alma é saber que esses jovens serão adultos num ambiente de aquecimento global, insegurança alimentar e competição predatória, e precisarão de notável capacidade de liderança e criatividade para dar respostas inteligentes a essas questões. Entretanto, infelizmente, estamos despreparando-os para esse mundo tumultuado que nós mesmos criamos.
Quando as crianças são atingidas pela SPA ( Síndrome do Pensamento Acelerado) na primeira infância, até os cinco anos, os pais ficam extasiados, acham que seus filhos são gênios. Não percebem os sintomas. Têm orgulho de contar a todos a esperteza dos filhos, que assimilam as informações rapidamente e têm respostas para tudo. Para piorar o quadro de gênios, colocam-nos num mar de atividades (escola, aprendizado de línguas, música, esporte) e, além disso, permitem que acessem as redes sociais indiscriminadamente. Esse processo agita mais a mente deles.
Não sabem que crianças têm de ter infância, criar, elaborar, estabilizar sua emoção, dar profundidade aos seus sentimentos, colocar-se no lugar do outro, pensar antes de reagir, aquietar a mente; caso contrário, terão uma emoção instável, insatisfeita, irritadiça, intolerante a contrariedades e, claro, hiperpensante.
Os anos passam, e, na segunda infância, pré-adolescência e adolescência, os pais começam a perceber que algo está errado. O gênio desapareceu. Seus filhos querem cada vez mais para sentir cada vez menos, são insatisfeitos, indisciplinados, têm dificuldade de expressar gratidão, sua autoestima (maneira como se vêm) está fragilizada, não aceitam "não", são impacientes, querem tudo na hora.
É fundamental que os pais não dêm presentes e roupas em excesso aos filhos nem coloquem em múltiplas atividades. É igualmente fundamental que conquistem o território da emoção deles e saibam transferir o capital das suas experiências, ou seja, que lhes deem o que o dinheiro não pode comprar. Não devem deixá-los o dia inteiro conectados em rede sociais e usando smartphones. A utilização ansiosa desses aparelhos pode causar dependência psicológica como algumas dr**as. Tire o celular deles por um dia e veja como reagem; alguns se deprimem. Além disso, crianças e adultos jamais deveriam usá-los em excesso à noite ou dormir ao lados desses aparelhos, pois sua tela produz um comprimento de onda azul que dificulta a liberação, no metabolismo cerebral, de substâncias que induzem o sono.
Pais que superprotegem seus filhos e lhes dão tudo o que pedem colocam combustível na SPA destes. Como digo no livro Pais brilhantes, professores fascinantes, lembre-se de que bons pais dão presentes e suportes para a sobrevivência dos seus filhos, mas pais brilhantes vão muito além: dão a sua história, transferem o mais excelente capital, o das experiências. Muitos pais perdem seus filhos porque não conseguem fazer da relação uma grande aventura.
Fonte: Augusto Cury - Ansiedade - Como enfrentar o mal do século.