11/04/2019
[A dança do terapeuta]
Hoje trago um trecho provocativo e inspirador de Maureen O’Hara (1983). Sempre utilizo-o nas minhas turmas de supervisão e este nos recupera ao desafio de ser terapeuta e a não objetificar o outro, sua vida e seu sofrimento.
Gratidão, gigante Maureen OHara! ♥️
—> Que acham? Comentem aqui. 😉
“Ah! Que conforto é esta ilusão de que sabemos o que está errado e de que sabemos como consertar! Que segurança é sentarmos na cadeira do respeitado expert e futricar no mundo interno de uma tal maravilhosa e milagrosamente complexa criatura.
Por outro lado, se renunciarmos ao nosso senso de segurança, e admitirmos que este ser diante de nós é tão complexo, único e misterioso como nós somos; é uma pessoa, e que essa pessoa existe dentro de um contexto, então toda a natureza do encontro muda.
Ao invés de ser um expert, o terapeuta se transforma num colaborador, num companheiro na exploração do mundo imediato do cliente. O terapeuta tem de renunciar ao poder e controle sobre a situação que desabrocha e estar preparado para entrar plenamente na dança de possibilidades que os dois juntos criarão. Renunciar ao controle significa que devemos estar preparados para aceitar que o mundo de cada um é único. Devemos renunciar a conceitos fixos sobre ‘o’ mundo, no sentido de ver, sentir e ser no lugar do outro.
Nesta dança nascente, recriada a cada momento, os dos se encontram. O terapeuta será atraído para o novo, para experiências novas e desconhecidas. Para tanto, ele tem de renunciar à defensividade, ser aberto para aprender sobre sua própria natureza, porque esta novidade é sempre desafiante, mas nem sempre prazerosa.
Devemos confrontar os limites da natureza humana do mais profano ao mais sacro, do transcendente ao trivial. Devemos confrontar nossa fúria assassina, nosso, próprio terror e cobiça, nosso próprio desespero.
Naturalmente, para sermos capazes de entrar na dança, devemos ser capazes de acreditar na capacidade intrínseca das criaturas vivas para se auto-regular, na tendência intrínseca para crescerem e se curarem. Entrar na dança suspeitando da natureza humana, suspeitando que ser natural é ser destrutivo é um risco que nenhuma pessoa sensível correria.
Com o conhecimento do processo da vida, com a experiência da aparentemente miraculosa tendência para a sanidade, para o equilíbrio homeostático, não é mais um risco envolver-se na dança da vida com nossos clientes, mas, antes, uma oportunidade. Uma oportunidade para descobrir mais sobre nossa própria natureza e sobre a natureza do universo.
(…) Não temos que ‘consertar’ nada. Nossos clientes consertar-se-ão por si próprios se pudermos aprender a estarmos presentes com relação a nós próprios, a eles e a nossos grupos, nesse estado de nos entregarmos ao que quer que brote em nós. Nossos companheiros humanos nos necessitam não pelo que podemos fazer, mas pelo nosso essencial ser, pela nossa natureza. Necessitam de nós para trazermos nossa energia à sua jornada, que, no momento, é muito difícil de ser empreendida a sós. Precisam de nós para que testemunhemos os eventos que estão vivendo, e para sermos pelo menos um outro, de tal forma que a união com o universo possa ser possível” (O’HARA, 1983, págs 99-102).
TRECHO DO LIVRO: Rogers, C. et al. (1983). Em busca de vida – da terapia centrada no cliente à abordagem centrada na pessoa. São Paulo: Summus.