03/05/2025
Faz exatamente um ano desde o início da enchente que paralisou Porto Alegre. Eu me lembro com nitidez daquela sexta-feira: acompanhei as notícias desde cedo, esperando que nosso querido chapéu de palha aparecesse com um pronunciamento oficial pedindo pra todo mundo ficar em casa. Nada veio. E como não houve alerta, mantive os atendimentos.
Mas não demorou. Quando deu meio-dia, o Centro Histórico já estava bloqueado e alagado. Foi naquele dia que criei uma regra pessoal que carrego até hoje: não importa se teve ou não teve aviso oficial — eu vou observar a situação e tomar a melhor decisão com base no que vejo, sinto e entendo.
O que veio depois foi um turbilhão de emoções. A ansiedade tomou conta dos pacientes, dos amigos próximos, da cidade. E por mais estranho que pareça, nada do que aconteceu me surpreendeu. A gente já sabia, em algum nível, que isso ia acontecer. Que isso vai continuar acontecendo. Mesmo assim, foi impossível não se sentir impotente ao ver a orla tomada pela água, transformada em porto seguro para quem vinha das ilhas. Uma imagem que me marcou profundamente. Uma cena entre as mais duras que já presenciei.
Maio de 2024 foi como um déjà-vu da pandemia: o isolamento, a insegurança, a sensação de que o chão tinha sumido debaixo dos nossos pés mais uma vez.
Hoje, ao olhar para trás, entendo que essa enchente não foi um acaso. Foi mais um sinal claro do que as mudanças climáticas vêm nos dizendo há anos. As chuvas mais intensas, o calor extremo, o frio que chega fora de época… todos esses eventos têm se tornado mais frequentes e mais severos. E se antes eram exceção, agora são o novo normal. A ciência já alertava: mudanças climáticas não são sobre o futuro — são o presente. E nós estamos vivendo isso, bem aqui, bem agora.
Esse último ano me ensinou que resiliência não é só uma palavra bonita. É uma prática diária. É estar disposto a aprender, a mudar planos, a se adaptar. É acolher o medo e mesmo assim seguir em frente. E, acima de tudo, é reconhecer que cuidar da nossa saúde, do nosso território e das nossas relações é uma forma de resistência.