18/10/2020
Tenho gordura nas artérias! Por quê?
Aterosclerose é o nome que se dá ao acúmulo de placas de gordura nas artérias e ela pode acometer as mais diversas regiões do corpo: os vasos das pernas, do pescoço, do cérebro, dos rins, do coração... Essa deposição faz parte de um longo processo que geralmente se inicia na infância e na adolescência e repercute na fase adulta, gerando os mais diversos problemas como infartos, AVCs, doença crônica nos rins com necessidade de diálise, amputações etc. Por isso, é tão importante entender como essa gordura se deposita nos vasos e quais são os mecanismos que impedem a sua piora e atuam na sua reversão.
Para começar, a artéria (vaso sanguíneo que carrega sangue do coração para o resto do corpo, geralmente oxigenado) possui 3 camadas: uma mais interna, chamada íntima, onde estão as células endoteliais; uma média, onde se localizam as células musculares lisas; e uma mais externa, chamada adventícia, formada por colágeno e fibras elásticas. Todas essas camadas participam da formação da placa de gordura, mas o processo se dá principalmente nas duas mais internas. De maneira sucinta, vários fatores de risco, como pressão alta, cigarro, sedentarismo, açúcar alto no sangue, excesso de colesterol geram alteração no funcionamento das células endoteliais presentes nessa camada mais interna do vaso. Esse "erro" se deve ao aumento de uma molécula chamada VCAM-1, que permite a entrada de algumas células do sangue, chamadas de leucócitos, para dentro da parede do vaso. Um tipo especial de leucócito, chamado monócito se transforma em um outro tipo: o macrófago, capaz de fagocitar (comer) as partículas de colesterol ruim que foram absorvidas e oxidadas previamente pelo vaso. Esse macrófago então, f**a cheio de gordura e se transforma no que chamamos de células espumosas. Nessa primeira etapa, o que vemos é a formação de estrias gordurosas nos vasos, um processo potencialmente reversível pela mudança do estilo de vida!
Entretanto, as células espumosas são extremamente nocivas e liberam várias substâncias que aumentam a inflamação no vaso, além de estimularem o sistema imune, através dos linfócitos T, a produzirem cada vez mais inflamação. A inflamação é o mecanismo principal por traz da formação da placa de gordura: é por causa dela que as células musculares da camada média migram para a camada íntima, iniciando a formação de uma cápsula fibrosa que recobrirá uma quantidade cada vez maior de gordura, pois os macrófagos (células que comem gordura) entram em maior número dentro da célula, quanto maior a inflamação. Nessa segunda etapa, uma placa aterosclerótica mais complexa é produzida: com muita gordura, células inflamatórias, calcif**ação e uma capa fibrosa. No começo, essa placa de gordura apenas deixa o vaso mais espessado, mas com o tempo, começa a entrar no lúmen (o canal onde o sangue passa propriamente) e gera "entupimento".
Hoje sabemos que esses entupimentos não precisam obstruir totalmente a passagem do sangue para gerar infarto. Na verdade, a causa mais comum de infarto é a ruptura da capa fibrosa que envolve a gordura, o que ocorre principalmente por um desequilíbrio entre a produção e a degradação dos componentes da capa. Quando a degradação vence a produção, o que geralmente acontece com o aumento inflamatório progressivo, a capa f**a "fina" e suscetível a romper, deixando exposto seu conteúdo interno, que ativa componentes sanguíneos, produzidos pelas plaquetas, e que formam um trombo capaz de obstruir subitamente a passagem do sangue e gerar infarto. Essa é terceira etapa da placa aterosclerótica, aquela capaz de gerar eventos súbitos e graves, por rotura da sua capa fibrosa e precipitada por uma inflamação recalcitrante. É por esse motivo que a mudança de estilo de vida e alguns medicamentos ajudam tanto na contenção e até reversão das gorduras nas artérias. O exercício físico, por exemplo, ajuda a diminuir a pressão arterial, um dos fatores que alteram o funcionamento das células endoteliais. Além disso, aumenta a produção de óxido nítrico, uma substância que aumenta a dilatação dos vasos e que limita a expressão daquela molécula que vimos lá trás, a VCAM-1 (essa é aquela que deixa mais macrófagos, as células comedoras de gordura, entrarem nos vasos). Outro exemplo é o das estatinas. Está mais que provado que a diminuição do colesterol ruim, diminui eventos como infarto, AVC, morte. Mas as estatinas (sinvastatina, atorvastatina, rosuvastatina...) atuam não só na diminuição do colesterol ruim, elas também diminuem a inflamação e aumentam a produção da capa fibrosa na placa de gordura, impedindo sua ruptura.
Ou seja, podemos sim atuar contra os mecanismos de depósito de gordura nas artérias e se queremos ser o mais ef**azes possíveis devemos cortar o mal pela raiz e atuar naqueles primeiros passos: fazer atividade física, cortar o cigarro, comer mais frutas, verduras, menos carboidratos, menos gordura!