15/02/2020
Há muitos coágulos no sangue. Intensidades/potências que são estranguladas, cerceadas, estancadas, espancadas. O corpo recuperado, encerrado nos feudos das axiomáticas que prometem reconhecimento aos corpos obedientes, subordinados, disciplinados, dóceis, derrotados nas gangrenas produzidas pela exploração, repressão e opressão das multiplicidades que percorrem os corpos e as pluralidades que o corpo pulsa. Porém o sangue pulsa vibrando as ressonâncias das palpitações do coração alisado pelo latejar das sonoridades originárias dos magmas incorporeos de novas sensibilidades. Os sangues irreverentes ecoam peles arrepiadas, eruptivas, lisas, estriadas, re- porificadas pelas carícias de insurgências que encarnam atualizações indomáveis. As peles susurram vísceras dançantes, aceleradas, lentas, humores borbulhantes, membranas perplexas, mucosas que emanam fluxos acolhendo as levezas e viscosidades dos encontros. Sangue domesticada e sangue rebelde, sangue que desestratifica e sangue encurralada nas repressas de capturas que avassalam os movimentos. Imanências entre os acasos, variações, improvisações, espontaneidades, tocata/fuga e os estampados de notas métricas nos pentagramas que programam os cursos daquilo que alguma vez foi novo. "Tudo é um caso de sangue" dizia Deleuze. Pinçamos, roubamos e colocamos esa afirmação em outros platôs. Que experimentações, quê invenções, quais criações, quê nomadismos, quê encontros fazem parir territórios onde bricolear novos corpos que encarnen e reencarnen intensidades sublevadas e novos extensos que rascunhem novas referências?. Um ditador berrou: "a letra com sangue entra". A letra do outro que incrusta a letalidade do dever, a obediência, a submissão, a carne humilhada. Solilóquio do outro que simula diálogos. Mas quê letras intempestivas fluem, saem, transbordam desse sangue que reponha o sentido primigenio das palavras-ações-sensibilidades que fazem mantilhas que povoam novos corpos-territórios?
Raspemos de modo urgente as crostas e intensifiquemos todos os agires que produzam corpos das dignidades insurgentes.
Imagem: Remedios Varo