15/10/2025
Educar é, à luz da psicanálise, um ato de intervenção no mal-estar da civilização. Teria, então, o professor a complexa tarefa de mediar o desejo da sociedade (criar laços sobre a cultura e as normas) com os desejos e pulsões de cada estudante?
O educador, assim como o analista, lida com a resistência, justamente porque quem se coloca diante de um professor ou uma professora em um sala de aula não é uma tábula rasa, mas pessoas cheias de investimentos libidinais, fantasias e, por vezes, uma recusa ativa ao conhecimento que lhe é oferecido. Nesse sentido, talvez, seria interessante observar que, em muitos momentos em uma sala de aula, o que se faz na verdade é um convite à renúncia, ou seja, propõe-se que estudantes abram mão de seu narcisismo originário ("já sei tudo") para aceitar que há um saber que lhe falta. E que nunca será preenchido. Desse modo, ousamos comparar esta operação delicadíssima à que ocorre em uma análise.
Além disso, se a partir de Freud, podemos inferir que o professor ou a professora medeia desejos, para Lacan, ele ou ela se situa no lugar do Sujeito Suposto Saber, isto é, ocorre por parte de quem estuda uma projeção no outro (o/a docente, no caso) para a uma posição de mestria. Nessa suposição, a transferência se sustenta, e o/a professor/a, que, na prática, sabe que não sabe tudo, pode assumir a posição de que sabe para conduzir cada estudante a um encontro com um saber, que é sempre parcial e falível.
Quando um/a docente assume, sem suposições, esse posto de saber referencial completo e infalível, sua tarefa tende a ser fadada ao fracasso, porque quando um educador ou uma educadora, portanto, assume a posição de um mestre que deposita conhecimento em um aluno vazio (o "modelo bancário" criticado por Paulo Freire), ele perde a chance de se tornar o veículo que causa o desejo de saber.
Considerando o clichê de que o bom professor não é quem oferece respostas prontas, mas quem provoca perguntas, poderíamos reescrevê-lo afirmando que ele ou ela não preenche uma lacuna, mas a mantém aberta, mostrando que o saber é um território infinito a ser explorado. Sua missão é falhar produtivamente: ao se deparar com a impossibilidade de transmitir o saber por completo, ele abre espaços de oportunidade para que se faça o que se é possível fazer em termos de educação e ensino: produzir conhecimento em conjunto.
✍️ Texto de Roberto Perobelli