09/11/2025
Selénio e Coenzima Q10: Suplementos para viver mais tempo e com melhor qualidade de vida
O cardiologista sueco Urban Alehagen esteve em Lisboa para discutir estudos inovadores que ligam o selénio e a coenzima Q10 à longevidade. Seu trabalho mostra que a combinação desses nutrientes pode reduzir drasticamente a mortalidade por doenças cardíacas e até retardar os sinais de envelhecimento. Num ensaio clínico com 443 idosos suecos saudáveis (4 anos de suplementação diária de 200 µg de selênio + 200 mg de Q10 vs. placebo), o grupo tratado teve mortalidade cardiovascular muito menor e melhora da função cardíaca. Em 10 anos de acompanhamento, o risco de morte por doença do coração permaneceu cerca de 50% menor no grupo suplementado. Esses efeitos positivos sobreviveram a múltiplas análises estatísticas: mesmo considerando fatores tradicionais de risco (idade avançada, tabagismo, hipertensão, diabetes, doença arterial coronariana, insuficiência cardíaca, anemia etc.), o grupo suplementado continuou apresentando redução signif**ativa da mortalidade.
O estudo sueco e seus resultados principais No estudo sueco Kisel-10, 443 idosos de uma comunidade rural receberam, durante quatro anos, cápsulas diárias de 200 mg de coenzima Q10 mais 200 µg de selênio (iodado) – doses encontradas em suplementos como o Selenoprecise (Pharma Nord). O resultado foi notável: a taxa de morte cardiovascular chegou a apenas 6% no grupo ativo, frente a 13% no placebo. Em termos estatísticos, isso corresponde a um risco relativo de morte quase metade no grupo que usou selênio+Q10. Além disso, o seguimento por 10 anos mostrou que a proteção se manteve no longo prazo. Curiosamente, a suplementação também melhorou a função cardíaca dos participantes – por exemplo, níveis menores do biomarcador NT-proBNP (indicador de estresse no coração) foram observados no grupo tratado, sugerindo coração mais forte.
A robustez do efeito surpreendeu os próprios pesquisadores. Alehagen conta que, mesmo após ajustar para idade avançada, tabagismo e várias doenças prévias, a intervenção forneceu uma queda de risco acima de 50%. Em outras palavras, as cápsulas foram mais poderosas que muitos fatores de risco combinados. Depois dos quatro anos de uso ativo, os participantes continuaram sendo acompanhados por mais oito anos. Ao fim desse período estendido, constatou-se que a proteção sobreviveu: o grupo suplementado teve signif**ativamente menos mortes por qualquer causa. Essa redução na mortalidade total reforça a ideia de que o benefício se traduz em ganho de sobrevida geral.
Por que falta selênio na dieta Uma peça-chave dessa história é que o selênio praticamente desapareceu da dieta da maioria dos europeus. Alehagen lembra que, na graduação, nunca tinha ouvido falar desse mineral – uma falha comum, já que a ingestão de selênio caiu muito nas últimas décadas. Estima-se que as células precisem de cerca de 120 µg de selênio por dia para funcionar bem, mas praticamente nenhum país europeu atinge isso sem suplemento. Por exemplo, no Reino Unido a média de ingestão diária é de apenas 40 µg – pouco mais da metade da necessidade básica. Mais da metade dos idosos britânicos (>65 anos) consome menos de 40 µg/dia, muito abaixo do que as dietary reference intakes recomendam. Essa deficiência não está restrita ao Reino Unido: solos pobres em selênio são comuns na maioria da Europa, Austrália, Nova Zelândia e África do Sul. Como consequência, até alimentos ricos em proteínas (cereais, carne, peixe, ovos, leite) fornecem quantidades modestas de selênio.
Imagine compensar sem suplemento: seria preciso comer cerca de 1,5 kg de carne ou peixe por dia para atingir ~120 µg de selênio, na conta do próprio Alehagen. Em termos práticos, isso é inviável. Por isso ele enfatiza que a suplementação é quase a única alternativa prática: “Como nascemos na Europa, estamos expostos a muito pouco selênio”, diz, e só há evidências para apoiar o início da suplementação a partir dos 20 anos de idade. Em outras palavras, adultos jovens já expostos ao baixo selênio do solo europeu devem considerar tomar cápsulas de selênio (por exemplo, via levedura de selênio) para manter níveis normais ao longo da vida.
Coenzima Q10: um nutriente que cai com a idade Ao contrário do selênio, não dependemos do solo: nosso corpo produz coenzima Q10 (uma molécula vital para energia celular). Porém, a síntese interna de Q10 declina acentuadamente com o envelhecimento. Estudos mostram que os níveis endógenos de Q10 começam a cair logo após os 20 anos e continuam caindo gradualmente com a idade. Essa queda torna o organismo mais vulnerável a doenças ligadas ao envelhecimento, já que a Q10 tem papel importante como antioxidante intracelular. Por isso, faz sentido considerar a suplementação de Q10 à medida que envelhecemos. Os benefícios só se materializam quando ambos – selênio e Q10 – estão em níveis adequados. Se apenas um deles for reposto, o efeito é limitado. Mas com a dupla, o organismo recebe reforço completo contra danos oxidativos e inflamação, junto de combustível extra para o coração e músculos.
De fato, Alehagen destaca que a combinação selênio+Q10 oferece diversos efeitos positivos no corpo (além do coração). Entre eles estão:
Redução da inflamação crônica: os antioxidantes oriundos de Q10/selênio podem frear processos inflamatórios acelerados pelo estresse oxidativo.
Combate ao estresse oxidativo: com mais Q10 nas mitocôndrias e maior atividade das selenoproteínas (como GPx), as células neutralizam melhor os radicais livres.
Melhora da função renal: estudos clínicos observaram ganhos na função dos rins em idosos suplementados com ambos, talvez por menor dano oxidativo nos tecidos.
Prolongamento da vida celular: um ambiente intracelular menos “enferrujado” mantém as células vivas por mais tempo, atrasando a senescência.
Maior qualidade de vida geral: com menos dor, cansaço e doenças, os idosos relatam melhor disposição e independência. Alehagen nota que todos esses efeitos culminam em melhor saúde “na prática”, levando a um envelhecimento mais saudável.
Perguntas a Urban Alehagen que nos respondeu ao telefone:
Suplementação – doses e idade recomendada: Alehagen explica que, em países com solos pobres em selênio, sem cápsulas seria preciso algo como 1,5 kg de carne/peixe por dia para atingir 120 µg de selênio – algo impraticável. Assim, tomar suplementos é a única opção realista para equilibrar os níveis desse mineral. Ele ressalta que não há dados em crianças, mas as evidências apontam para começar a suplementar após os 20 anos e manter indefinidamente.
Impacto em outras doenças (ex.: câncer): Nosso estudo principal envolveu pessoas saudáveis, não doentes de câncer, e foi relativamente pequeno (443 indivíduos), de modo que muito poucos tiveram diagnóstico de câncer ao longo de 10 anos. Por isso, não foi possível concluir nada específico sobre câncer: o número de casos foi muito baixo e similar entre grupo ativo e placebo. Alehagen cita, porém, pesquisas anteriores isoladas (como um estudo francês sobre câncer de próstata) mostrando que o selênio isoladamente foi ligado a incidência muito baixa de câncer. Ele sugere que, se combinados com Q10, esses efeitos poderiam ser ainda mais fortes. Mas reconhece que isso ainda não foi comprovado em grandes ensaios, por enquanto.
Atenção da comunidade científ**a: Segundo ele, há hoje mais interesse, mas a mudança é lenta. Já foram 30 estudos publicados sobre selênio e Q10, o que começa a convencer a cardiologia. Outros grupos começaram estudos semelhantes – por exemplo, na Holanda e no Reino Unido – buscando confirmar os efeitos antioxidantes e cardiovasculares. À medida que esses resultados vierem, mais médicos e organizações de saúde deverão se abrir para a ideia. “Mas o progresso tem sido mais devagar do que gostaríamos”, admite.
Revolução na qualidade de vida? Alehagen evita prometer “milagres”, mas enfatiza que esta intervenção é extremamente econômica em comparação aos tratamentos convencionais. “Revolucionar” seria exagero, mas ele está convencido de que reduzir a inflamação crônica (associada ao baixo selênio) aumentará a sobrevida e o bem-estar médio da população. De fato, no estudo houve redução geral da mortalidade no grupo suplementado, sugerindo que as pessoas viveram mais tempo com menos doenças. Em suma, melhorar o status de selênio e Q10 nos idosos pode elevar, de forma simples e barata, a qualidade de vida na velhice.
Alfonso Soares Nobre
Psicólogo Clínico