22/10/2025
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Não vos vou dizer que tudo ficará bem.
Seria uma mentira confortável. As mentiras confortáveis são a principal droga de uma sociedade que foge de tudo o que não sabe controlar. O que vos espera não é um caminho recto, não há um Manual de Instruções. O que vos espera é uma travessia. Às vezes vai ser bela, às vezes vai ser exaustiva. Vai ser sempre feita de perguntas para as quais ninguém tem respostas completas.
O vosso filho não vive “fora” do mundo.
Vive num mundo próprio. O vosso filho não quebra nada; só não dança a música imposta. Haverá dias em que as palavras dos outros vos ferirão mais do que o silêncio, momentos em que amar parecerá insuficiente. Muitas vezes, não é. Isso não é fracasso; é humanidade.
O autismo não é uma tragédia.
O mundo fá-lo parecer. A tragédia está na rigidez das estruturas, na impaciência dos olhares, na velocidade absurda das escolas, dos empregos, das relações. O vosso filho não corre ao ritmo dos outros. Vê detalhes que os outros ignoram, sente vibrações que os outros não percebem, ou simplesmente não quer correr.
Amar uma criança no espectro é aprender uma língua sem dicionário.
A comunicação nem sempre acontece com palavras. O silêncio pode ser uma forma de presença. O amor, por maior que seja, não anula o cansaço. Não há mal algum em admiti-lo. Serão tentados, muitas vezes, a comparar. A imaginar como seria “se fosse diferente”. Não se culpem por isso. Pensar o que poderia ser não vos torna maus pais.
Não procurem ser perfeitos.
Resistam à tentação de traduzir tudo em “normalidade”. O vosso filho não precisa de ser corrigido; precisa de ser compreendido.
Não se deixem engolir pela solidão.
A solidão dos pais é um silêncio perigoso. Não se deixem naufragar nele. Amar uma criança no espectro é uma forma rara, e bruta, de amor: não há garantias, não há medalhas. Há vocês e uma criança que sente a vossa presença como âncora. Aguentem-se aí, sim?
Com respeito absoluto,
Pedro