11/10/2025
A indiferença
É muito difícil ser-se pessoa! E pessoa crescida mais, ainda. E ter-se uma quantidade enorme de compromissos e de responsabilidades e acorrer a tudo isso sem comprometer aquilo que se sente, tudo o que se deseja e as relações que não dispensam os cuidados que temos de lhes dedicar, todos os dias.
Compreende-se que, muitas vezes, para as pessoas crescidas, o melhor do mundo sejam as crianças. Sobretudo quando dão conta de tudo o que perderam e passam a só acreditar no futuro quando olham para trás.
Mas a parte mais difícil de se ser uma pessoa crescida decorre duma tirania mais perigosa e mais silenciosa de entre todas as outras que se ancoram sobre princípios políticos ou religiosos: a tirania da indiferença.
A indiferença como antítese da sensibilidade. Ou como défice de atenção instituído. Com que nos rendemos à falta de inteligência, à má educação, à falsidade, ao narcisismo ou à fealdade dos tempos modernos, diante da qual nos tornamos submissos.
A indiferença da falsa igualdade. Como se a igualdade se construísse pela forma com que renegamos a singularidade e malbaratamos o engenho com que as diferenças nos levam a crescer, sempre que as dividimos uns aos outros.
E a indiferença com que a nossa necessidade de amor vive, em comunhão de insatisfeitos, com o desamor.
Quanto mais é difícil ser adulto e crescido mais fácil se torna escorregar para a indiferença
O problema é que a indiferença nunca manda totalmente em nós. Uma parte vai ficando dura, ressequida e indiferente. E outra, como a caixa negra dum avião, regista (ao segundo) sensibilidade, imaginação e empatia. Uma parte sente e a outra faz por iludir e por esquecer: uma parte é verdadeira; e a outra mascara.
Porque é que a nossa necessidade de empatia e de proximidade parece encarquilhar-se com a agitação, o desconsolo ou a mágoa, com que lidamos, em doses suaves, todos os dias?
Porque a indiferença torna as pessoas crescidas conformadas. Quando elas, livres do seu jugo, são pessoas mais velhas, sim; mas com o entusiasmo de quem torna a vida mais fácil. Sempre que a vive com sensibilidade, com escuta e empatia, para sempre.